Aviação Comercial

Comparativo 2000–2024/25: novos hubs, pandemia e Brasil sem protagonismo

A comparação entre os rankings de 2000 e 2024/25 evidencia a emergência de novos hubs globais, o efeito da pandemia e os motivos que mantêm o Brasil fora do protagonismo internacional

Ao longo de 25 anos, o panorama da aviação mundial sofreu uma mudança profunda. Os dados mais recentes da Airports Council International (ACI) mostram que a lista dos aeroportos mais movimentados do planeta não se parece mais com a do ano 2000. Se no início do século a relação era dominada por Estados Unidos, Europa Ocidental e Japão, em 2024/25 observa-se a consolidação de grandes centros no Oriente Médio, na Índia, na Turquia e na China, refletindo a redistribuição econômica e demográfica do tráfego aéreo global.

Essa transformação revela não só novos nós de conexão, mas também o crescimento de mercados antes periféricos e a formação de sistemas aeroportuários modernos e de grande capacidade.

Em 2000, Atlanta, O’Hare, Los Angeles e Dallas encabeçavam um ranking que colocava seis dos dez primeiros aeroportos nos Estados Unidos. Londres Heathrow representava a força europeia, enquanto Tóquio Haneda era o único aeroporto asiático no top 10.

Era, portanto, um retrato do mundo anterior à ascensão da China como potência turística e econômica global, bem distante da posterior emergência dos hubs intercontinentais do Golfo. Tratava-se de um sistema robusto, porém apoiado em aeroportos próximos de sua capacidade operacional e em duas grandes regiões econômicas dominantes à época: os EUA e a União Europeia.

O quadro de 2024/25, contudo, é outro. Atlanta segue na liderança em movimentação, mas ao seu redor surgem concorrentes capazes de disputar o topo. O aeroporto de Dubai, embora próximo de sua capacidade máxima, firmou-se como o principal hub intercontinental fora do eixo tradicional, impulsionado por longas conexões e por um modelo de negócios centrado no tráfego internacional.

Emergem com forte potencial Istambul e Nova Delhi, que rapidamente se tornaram nós estratégicos em redes globais e regionais, enquanto aeroportos chineses avançam no ranking à medida que o mercado doméstico e o turismo crescem.

Diversos fatores explicam essa mudança: a demanda acelerada na Ásia, o fortalecimento econômico de amplas regiões emergentes e a limitação física de crescimento de muitos aeroportos europeus. Nos Estados Unidos, acumularam-se décadas de baixos investimentos em infraestrutura aeroportuária, deixando instalações defasadas e quase saturadas, além de crises políticas que afetaram a capacidade de investimento de longo prazo.

A Turquia reposicionou-se como ponte entre Europa e Ásia com o novo aeroporto de Istambul. Esse movimento, quase cinco séculos após o amplo domínio turco entre Oriente e Ocidente, reforça a vocação estratégica do país. De modo semelhante, os Emirados Árabes Unidos desenvolveram um modelo de aviação de longo alcance sustentado pela posição geográfica, por condições climáticas favoráveis e por uma estratégia nacional orientada à economia globalizada.

Índia e China expandiram seus mercados internos em ritmo sem paralelo, impulsionados pelo crescimento econômico das últimas duas décadas. O resultado é uma geografia do tráfego aéreo mais distribuída, mais asiática e menos centrada no Atlântico Norte.

Os números também mostram que o tráfego aéreo cresceu de forma consistente ao longo de duas décadas, com uma interrupção abrupta em 2020. A pandemia de covid-19 provocou o maior choque operacional da história da aviação, reduzindo momentaneamente o fluxo global de passageiros a níveis comparáveis aos da década de 1990. Muitos aeroportos antes entre os mais movimentados ficaram praticamente inativos. A recuperação, porém, seguiu ritmos diferentes conforme o modelo de cada país. A partir de 2021 o setor reorganizou-se rapidamente e reconfigurou o mapa da demanda.

Agora, em 2025, a aviação passa por uma fase de crescimento global contínuo. O tráfego total já ultrapassa com folga os números pré-pandemia, impulsionado pelo turismo internacional, por economias em aceleração e pela renovação de frotas com aeronaves mais eficientes.

Aeroportos modernos, projetados para 100 milhões de passageiros ou mais, tornaram-se o novo padrão, especialmente na Ásia e no Oriente Médio. O ritmo de expansão indica que, até o final da década, novos terminais chineses e indianos deverão entrar no top 10, enquanto hubs europeus enfrentam limites estruturais de capacidade.

Comparar 2000 e 2024/25 é testemunhar uma mudança de era. A aviação deixou de ser um sistema centrado no Atlântico Norte para tornar-se um fenômeno verdadeiramente global. O ranking dos aeroportos mais movimentados reflete hoje esse deslocamento econômico, demográfico e estratégico que redefine por onde e como o mundo voa.

O Fator Brasil

O Aeroporto Internacional de São Paulo/Guarulhos segue como o principal hub do Brasil, mas permanece fora do top 20 global em movimentação de passageiros. Com 38,2 milhões de viajantes até outubro de 2025, GRU opera muito aquém dos grandes terminais internacionais, que superam 60 milhões por ano e chegam a ultrapassar a marca de 100 milhões.

Essa diferença não se explica apenas por capacidade física — o aeroporto tem potencial técnico para expandir —, mas sobretudo pelo ambiente econômico e político que limita o crescimento do transporte aéreo brasileiro. Desde 2015, o país vive um ciclo prolongado de instabilidade, marcado por recessão, baixos investimentos públicos e privados, perda do poder de compra e crescimento inferior ao observado em mercados emergentes comparáveis.

A aviação no Brasil também enfrenta entraves estruturais, como um desequilíbrio fiscal persistente, insegurança jurídica e crescente judicialização, fatores que encarecem operações e afastam investimentos de longo prazo. A acentuada desvalorização do real na última década reduziu a competitividade das companhias aéreas ao elevar custos atrelados ao dólar.

Além disso, a posição geográfica do Brasil é menos favorável para conexões intercontinentais: o país está fora das principais rotas entre Europa, América do Norte, Oriente Médio e Ásia, o que limita o potencial de transformar GRU em um megahub internacional comparável a Dubai, Istambul ou Doha. O resultado é um aeroporto relevante regionalmente, mas estruturalmente impedido de competir no cenário global.

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